Semanário Regionalista Independente
Quarta-feira Janeiro 22nd 2025

“BBC – As Crónicas de TV”

Ui, as confusões que vão por Queluz de Baixo!

Bernardo de Brito e Cunha

É impressionante: basta acabar a “Casa dos Segredos” ou lá como se chamava aquilo (entretanto já começou uma outra coisa do mesmo género) para a TVI ficar armada em barata tonta. Mas entre a “Casa” e a nova coisa decorreu uma semana e, como se isso não fosse bastante – bastante porque o fim do programa implicava o términus da rubrica referente a ele, chamada “Extra” e apresentada por Isabel Silva –, também terminou o “Quiz” (acho que se chamava assim) e que era um jogo de adivinhas via chamada de valor acrescentado. De uma assentada, a TVI ficou ali com hora e meia, duas horas, por preencher. Nessa semana de transição, o canal foi buscar uma mini-série portuguesa e repô-la todas essas cinco noites da semana. O seu nome é “Redenção” e a ideia base era pura ficção mas não era completamente idiota. Um milionário (António Capelo) descobre, de repente (como sempre acontece nestas coisas), que sofre de doença de Parkinson e, em função disso, decide suicidar-se. É então que entra em cena Miguel Guilherme no papel de uma espécie de anjo-da-guarda e que lhe vem dizer que a coisa não é assim tão simples: antes de se poder suicidar vai ter de acertar contas e rectificar os erros cometidos com pessoas que prejudicou para poder chegar a milionário…

Mas o problema não se resolvia apenas com uma mini-série, ainda faltava tempo. E qual não foi a minha surpresa quando percebi que, depois do dilema de António Capelo, a TVI se preparava para exibir um filme: quem sabe o tipo de cinema geralmente exibido por esse canal, preparei-me para me deixar de televisão e recolher ao leito. Mas a surpresa obrigou-me a suspender o gesto do comando: a TVI ia transmitir uma adaptação de uma obra de Shakespeare. Fiquei a saber depois que a obra em questão era uma coisa mais ampla, uma produção da BBC 2 que, sob a designação genérica de “The Hollow Crown”, reunia quatro peças de William Shakespeare: “Ricardo II”, “Henrique IV” (partes I e II), e “Henrique V”, que contavam com a produção executiva de Sam Mendes. Em resumo, a TVI estava literalmente a “queimar” quatro peças de Shakespeare à uma e tal da manhã e, mais grave ainda, sem aviso prévio. Quantos viram uma coisa boa na TVI? Poucos. E muitos perderam esta oportunidade que sabe-se lá quando se voltará a repetir.

Mas a TVI, que já cometera esta argolada de programação, não se contentaria com isso e ainda iria dar um passo maior do que a perna: e a partir da segunda ou terceira peça, começou a anteceder a sua exibição com a indicação de que era comemorativa dos “400 anos de Shakespeare”. Esta exibição tem tido lugar desde os primeiros dias deste ano e os 400 anos de Shakespeare celebraram-se em 2016, dado que o Bardo faleceu a 23 de Abril de 1616. Mais: esta produção da BBC foi programada para ser exibida como parte integrante da “Olimpíada Cultural de 2012”, que foi uma celebração da cultura inglesa que coincidiu com as Olimpíadas de Verão de 2012. Acontece que a BBC não dorme e, perante o sucesso desta série de peças, programou logo a produção de outras para exibir durante os festejos dos 400 anos do escritor. Chama-se “The Hollow Crown: The War of the Roses”, que foi completada em 2015.

Até aqui está tudo mais ou menos maravilha, tirando as imprecisões da TVI e as suas opções de programação e horários. O que me deixa perplexo é o facto de, desde o princípio do ano, a TVI exibir todas as noites, estilo pescadinha de rabo na boca, as mesmíssimas quatro peças, as de 2012. Se alguém comprou essas, porque não comprou também as seguintes?

HÁ DEZ ANOS ESCREVIA

«Tivesse Dan Brown deixado de lado uma obra de ficção que fez êxito, tanto em livro como no cinema, “O Código Da Vinci”, e se tivesse debruçado sobre um caso da realidade portuguesa e hoje teríamos nas prateleiras um romance histórico que teria como título, talvez, “O Código Macedo”. É evidente que entre o mestre italiano e a ex-Secretária de Estado da Família com a tutela da Casa Pia no início dos anos 80 – que após a divulgação do escândalo de abusos na instituição afirmou publicamente ter visto fotografias comprometedoras e falou no envolvimento de personalidades no caso de pedofilia –, existe uma diferença: Da Vinci é um mestre das artes plásticas, mas Teresa Costa Macedo é também, a seu modo, uma artista na arte da contradição, do baralha e torna a dar. Atabalhoada, é certo: mas não se pode pedir tudo.»

(Esta crónica, por desejo expresso do seu autor, não respeita o novo Acordo Ortográfico.)

Crónica publicada no Jornal de Sintra, edição de 27 de Janeiro de 2017

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