Para partes desconhecidas
Bernardo de Brito e Cunha
Duarte Lima entrou, finalmente, na prisão, depois de muitos recursos, avanços e recuos, etc., enfim, o costume. No dia em que entrou no estabelecimento prisional – não sei bem qual, nem interessa – foi dito que já estava à sua espera uma cela especial para que ele, durante dez dias (julgo), fizesse a transição do mundo exterior para a área prisional. Fiquei com a nítida sensação de que se tratava de um astronauta que, de foguetão se aproxima da Estação Espacial Europeia, acopla – e depois fica uns dias em descompressão, de quarentena, para se ter a certeza que não levava bicharocos aborrecidos lá para dentro. Tudo lindo, sempre se tratou bem esta gente que fez parte dos governos ou que foram ministros: se fosse um de nós, meu deus…
Mas já que falamos disso, cabe uma pergunta: parece, dizia-se para aí, que Duarte Lima se tinha apropinquado com cinco milhões que eram pertença da viúva de Tomás Feteira. Despesas de tribunal, papéis, essas coisas… Onde pára o dinheiro? Se foram despesas de tribunal, papéis, fotocópias, etc., de certeza que há justificativos, recibos, facturas. Que fim levou esse dinheiro? Foi para o piano que Duarte Lima tem em casa? Ou foi utilizado na tal “câmara de descompressão”?
Portugal tem uma das gastronomias mais ricas do mundo, resultado de receitas e tradições acumuladas ao longo da nossa existência como nação. Ao longo de seis episódios, na RTP, seis chefs têm uma história para contar: a da “História da Gastronomia Portuguesa” – de que confesso já não ter visto todos os episódios.
Com o chef Ljubomir Stanisic (curioso, isto de um chef dos Balcãs vir descobrir coisas da nossa gastronomia…), o chef Kiko Martins, o chef Nuno Bergonse, a Chef Marlene Vieira, o chef Diogo Noronha e a chef Susana Felicidade viajamos pela nossa própria história, descobrindo e investigando livros antigos de culinária portugueses, desde as cozinhas reais às cozinhas comuns, do séc. XVI ao séc. XX.
Em cada episódio é analisado um século da história de Portugal através da gastronomia e hábitos da época. A protagonizar cada um dos segmentos está um dos chefs, que explora um livro de receitas publicado nesse século, com a ajuda de estudiosos e especialistas na matéria, que fazem o necessário enquadramento histórico, revelando curiosidades e factos. No final do episódio, o chef escolhe uma receita do livro para recriar, respeitando os métodos e utilizando os respectivos ingredientes em cozinhas da época. Até parece uma série estrangeira!
Enquanto isso, na TVI, já se sabe que o próximo “Master Chef”, que aparecerá nos nossos televisores depois do Verão, terá Manuel Luís Goucha apenas no papel de apresentador (acumulava com o de jurado, nas edições anteriores) e o próprio já veio aos ecrãs dizer que quer dar um toque de glamour a esse papel: ficámos assim a saber que se apresentará “em tons de azul e de rosa”. Mal posso esperar…
Enquanto Goucha não chega, acompanhei a última série de Anthony Bourdain, “Parts Unknown”. A série dividiu-se em duas partes: cinco episódios com destinos a “partes desconhecidas” e dois episódios em que o principal interveniente foi o próprio Anthony Bourdain e a equipa de rodagem a falar dele, a recordar os episódios e as graças que foram acontecendo ao longo de todas as séries. O curioso é que, principalmente nos cinco primeiros episódios, Bourdain parecia muito menos preocupado com a comida do que com as pessoas que encontrava e com quem falava, como se se tivesse ido despedir de todos os amigos – mesmo os de ocasião – antes de pôr fim à vida. Essas pessoas é que eram, verdadeiramente, as “partes desconhecidas”.
HÁ DEZ ANOS ESCREVIA
«É certo que tive a sorte de apanhar Mário Crespo com um entrevistado que quase dispensa as perguntas e se não o puserem fora do estúdio certamente não se cala: Francisco Louçã. À parte isso, o que achei curioso foi o tom plácido de Mário Crespo, calmo como se não estivesse a falar de um país em crise, sereno como que se os números desfiados pelo homem que tinha pela frente não fossem uma coisa extremamente importante da vida, da nossa vida actual, seráfico como se estivesse a falar com a mulher ou os filhos – se os tiver. É fácil encontrar por aí entrevistadores histriónicos, a quem tudo parece divertir, ou, no outro extremo, os que parece que estão sempre de “burro amarrado”. E o tranquilo Mário Crespo falava com o homem responsável (com outros, naturalmente, que estas coisas nunca são apenas obra de um homem só) por ter obrigado a maioria do PS a aprovar o levantamento do sigilo bancário.»
(Esta crónica, por desejo expresso do seu autor, não respeita o novo Acordo Ortográfico.)
Crónica publicada no Jornal de Sintra, ed. 4257 de 3 de maio de 2019