“Não se paga, não se paga!” em cena
Uma estória bem-humorada que, apesar de não ter sido escrita na última década, aponta mordazmente os principais problemas com que os cidadãos se deparam no quotidiano de hoje em dia: o desemprego, a falta de poder de compra, o desânimo, a insatisfação face ao governo. É assim uma pintura contemporânea da sociedade, recriada a partir do texto do Nobel da Literatura de 1997, Dario Fo, construída de forma inteligente sob os dramas e o absurdismo de peripécias de dois casais amigos, de um polícia, de um sargento e de um cangalheiro. São estes os ingredientes para uma peça que, apesar de divertida, leva o público a reflectir sobre a actualidade.
O Jornal de Sintra assistiu a um dos ensaios do “Não se paga, não se paga!”, que estreará hoje, sexta-feira, na Casa de Teatro de Sintra pelo Centro de Difusão Cultural Chão de Oliva, mas que teve já uma ante-estreia destinada especialmente “para os candidatos às eleições legislativas e autárquicas”, contou o encenador João de Mello Alvim, já que, numa altura em que se fala tanto em subsídios, mas que poucos são destinados às artes e à cultura, este será “o subsídio para os agentes políticos actuais”.
Um bis, 15 anos depois
O encenador apontou a ideia errada de que os criadores artísticos estão fechados à realidade: “Não, nós participamos da sociedade” e o teatro “tem uma função social”. “Ao fazer teatro não fechamos a porta e os problemas ficam do lado de fora”, explicou.
De facto, pela sua temática tão actual e devido à vontade da equipa do Chão de Oliva de “questionar a situação política, económica e social actual”, esta encenação volta ao palco, numa versão “redux” daquela que foi feita em 1994, exibida no extinto Cine Teatro Carlos Manuel.
A escolha de uma peça do escritor pouco convencional Dario Fo não foi inocente: “Fizemo-lo com a consciência da escolha de um texto que, para além de nos confrontar com realidades sociais amargas que, trinta e muitos anos depois não foram esbatidas, traz-nos também a alegria primordial do teatro: o jogo”, ressaltou João de Mello Alvim.
A peça tem também um lado afectivo, já que é uma homenagem à falecida actriz Maria João Fontaínhas, que protagonizou a personagem Antónia, na encenação de 1994, e que continua “presente no dia-a-dia do Chão de Oliva”.
O jogo de situações e de palavras, o drama e a comédia, a ironia e a expressividade dos actores focam “de forma leve, divertida e ao mesmo tempo trágica” temas com os quais o público, com certeza, se identificará.
texto e fotos: Vanessa Sena Sousa